Quarta-feira, 29 de setembro, 23h38. Estou distraído na cama, lendo um livro importante para uma aula que eu teria no dia seguinte, e meu celular toca. Era o Chaplin. A ordem era a seguinte: “Faça um artigo sobre os planos de governo!”. Como eu tenho medo do perigo, disse um modorrento e desesperado “sim, senhor”. Faltando apenas quatro dias para as eleições, seria impossível fazer uma analise individual para cada um dos nove candidatos, portanto resolvi juntar tudo em um artigo só. E vocês sabem: não dá para dizer “não” para o Chaplin, afinal, zelo pelo meu posto aqui no Negação Lógica.
Conseguir os planos de governo é relativamente fácil. Está tudo devidamente registrado e burocratizado no site do TSE, em menos de 10 minutos, já tinha baixado os nove arquivos em PDF, de todos os candidatos que almejam ser presidente da república a partir de 2011. Coloquei-os no bolso, para lê-los durante horas vagas no restante da semana.
Democrático que sou, optei pela ordem alfabética para a ordem de leituras, e assim, comecei com os “planos” de Dilma Rousseff(PT). 23 páginas, de um arquivo escaneado e rubricado pela candidata do governo, apresentam objetivos simples e sempre em linhas gerais, sem especificar nenhuma ação direta. E mesmo que fosse o plano mais bem formulado do universo, seria automaticamente descartado pelo meu espírito exigente assim que eu li o primeiro parágrafo:

“Este programa tem caráter provisório, uma vez que o definitivo deverá contemplar as sugestões de todos os partidos que integram a coligação que apoia a candidatura de Dilma Rousseff à Presidência da República.”

Oras bolas! Como assim? Fizeram um plano apenas para cumprir a burocracia e explicitar no primeiro parágrafo que ele não vale absolutamente nada? Que tudo pode ser mudado conforme os outros partidos quiserem? Isso que eu chamo de um plano flexível! Isso, como se não bastasse a patifaria que fora a apresentação deste documento. Foi noticiado na imprensa que o próprio PT apresentou e retirou o plano pelo menos duas vezes por divergências internas quanto ao seu conteúdo.
Mudando a página, cheguei ao candidato que começa com a letra “E”. Isso mesmo, meus amigos, “Ey, ey, ey… maellll! O democrata cristãooo!!!”. Já iniciei esta leitura um pouco mais satisfeito, afinal, a equipe do PSDC, diferente da campanha petista, deve ter acesso ao Word e enviou o texto devidamente digitado e diagramado. Mas as qualidades param por aí. Tenho a impressão que se o partido chegar ao poder, modificará o nome do Brasil para República Federativa do Brasil CRISTÃO! Isso mesmo, CRISTÃO com letra maiúscula. Afinal, além de citarem o cristianismo em dez de cada nove parágrafos, o programa utiliza deste recurso super mOdeRNu para destacar palavras chaves como REFORMA, CRISTÃO, NOVOS, CRISTÃO, EMPREGOS, SAÚDE, CRISTÃO, CULTURA, e… CRISTÃO. Parece até mensagem subliminar. Ou seja, absolutamente agressivo e entediante. Vamos ao próximo.
Em terceiro, chegamos ao partido historicamente mais antigo do Brasil, o Partido Comunista Brasileiro(PCB), que lançou candidato Ivan Pinheiro. Talvez este seja o plano de governo mais objetivo e direto de todos. Com 12 páginas, mas sem enfeites, todas as laudas estão totalmente ocupadas por textos claros e objetivos. Dividido em tópicos, contextualiza o momento histórico de 2010 e apresenta propostas pautadas nas diretrizes já conhecidas do partido: ataque a burguesia, ao capitalismo, ao neoliberalismo e blá, blá, blá, blá. Se todos aprendessem na escola o que de fato é o comunismo e perdessem o estereótipo de “comedores de criancinhas”, talvez a proposta fosse levada a sério no Brasil. Mas não é.
O “plano de governo” de José Serra(PSDB) é um tapa na cara e desrespeito com o eleitor. Simplesmente não há plano de governo. São dois discursos de José Serra que, de acordo com a introdução “resumem as ideias, propostas e principais linhas de ação pretendidas pelo candidato”. Ou seja, nada concreto. Nenhum projeto para o Brasil. Apenas discursos. E eu não preciso nem comentar sobre a credibilidade dos discursos de nossos políticos, não é?

Dando continuidade, chegamos ao dono da proposta mais inovadora e necessária do país: O Aerotrem! Isso mesmo, caros leitores, Levy Fidelix (PRTB) não deixou seu projeto utópico de fora da presidência. Mais uma vez, um arquivo toscamente escaneado. Oito páginas. Sete, na verdade. Pois a primeira trata-se da autenticação de veracidade do documento, ou algo que o valha. Diferente do Zé, este plano pelo menos apresenta métricas e objetivos claros para o governo. Dentre elas, a mudança do nome da bolsa-família para salário-família. Unificando-a com outros benefícios que o governo já oferece à algumas famílias. Mais ou menos a mesma coisa que o Lula fez com as bolsas de Fernando Henrique Cardoso. Nenhuma novidade.
Agora na letra “M”, Marina Silva(PV) chega chegando! Um arquivo de 36 páginas, colorido e ilustrado. Organizado e bem estruturado, se deu ao luxo de incluir até poesia logo no começo. Algumas páginas em branco deixam claro que um dos objetivos(não disse ser o único…) é encher linguiça. Pelo menos o Partido Verde teve a decência de contratar alguém para fazer um plano de governo bonitinho. Aposto R$10,00 que tem dedo de publicitário aí. Desde o texto, até o visual. Aquilo não é coisa de político nem aqui, nem no Qatar. Palavras como “virtuoso”, “integração”, “conquistas” e “prosperidade” são encontradas a cada linha. Enfim, é um plano que dá vontade até de chorar quando atentamos ao otimismo da campanha. Nosso Cândido Voltaire ficaria orgulhoso! Pena que seja genérico de mais. É o que eu chamaria de “continuísmo sustentável”, o que não é necessariamente ruim, mas não é tão inovador como a campanha em si.
Plínio de Arruda Sampaio(PSOL) foi tão direto no plano de governo como é nos debates. Duas páginas com 25 itens apresentam as “diretrizes gerais e tarefas” do partido. E já juntaram tudo. Além de ser o plano para o candidato à presidência, também já vale para os parlamentares e governadores. Reestatização de empresas, aluguel compulsório de imóveis desabitados, auditoria da dívida externa, enfim… As propostas padrão de um partido de esquerda como o PSOL, que é o hoje o que o PT era há 20 anos. Será que em 2030 eles estarão no poder!? Veremos… Ou não!

Rui Costa Pimenta(PCO), não satisfeito apenas com a avacalhação de uma propaganda feita com o Paint+PowerPoint, com destaque para aquela engrenagem medonha, resolveu seguir a tradição de amadorismo no plano de governo. Apenas uma página, já começa com a frase: “O Partido da Causa Operária não faz promessas eleitorais, comumente elaboradas neste período para fazer demagogia frente ao eleitorado”. Apenas deixam claro que seguirão os princípios da “tradição centenária de luta dos socialistas revolucionários marxistas”. Ou seja, não tem plano. Não sabem o que vão fazer no poder. Quando chegarem lá, eles resolvem. Parece até o Tiririca…
Por último, mas não menos importante, temos Zé Maria (PSTU). São quatro páginas com cara de manifesto, sem enfeites, o texto é bastante radical, se assemelhando ao do Partido Comunista Brasileiro nos protestos ao FMI, ataque a burguesia, ao capitalismo, ao neoliberalismo e blá, blá, blá, blá. A primeira frase é “O Brasil precisa de uma segunda independência!” e termina com uma frase de Engels: “a libertação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores”. Para bom entendedor, essas duas frases bastam. Marx deve estar muito orgulhoso na biblioteca celestial.

Se você chegou até o fim, parabéns! Meu texto acabou maior do que alguns dos próprios planos de governo! Lamentável, mas é isso. Aos que quiserem ver os planos completos, basta clicar nas imagens que ilustram este texto e fazer o download dos arquivos. Seria interessante se os brasileiros criassem o hábito de ler os planos de governo antes de escolher seus candidatos. Talvez sirva apenas para se decepcionar ainda mais e optar pelo NULO. Mas enfim, desde que seja um voto consciência, tudo vale.¬¬

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3 Comments

  1. Cheguei por estas paragens através do PodCume e já gostei do que vi. Não sou um ser totalmente alienado, mas confesso que nem ao mesmo sabia (ou tive o interesse) que poderia achar o plano de governo dos presidenciaveis assim tão facilmente. Mesmo depois de ter votado vou ler ou para me alegrar com a(o) nova(o) chefa(e) da nação ou para chorar, e vou procurar os planos e diretrizes dos deputados e senadores eleitos, assim, caso, na verdade quando, eles entrarem em desacordo com suas propostas de campanha dá para mandar um e-mail para o excelentissimo e cobrar o cara de pau.

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